Sunday, June 09, 2013

O dilema de Haddad

Na última quinta-feira, estudantes secundaristas e universitários pararam a Av. Paulista e despertaram o eficiente e empolgado ódio da Tropa de Choque da PM Paulista. Aplausos contidos, libertos em comentários de corredor aprovaram: "...tá certo, cambada de vagabundos". Manifestantes foram dispersos, o trânsito votou a fluir e a cidade mais rica do país prosseguiu na liderança plena do que chamam - e não entendem- de "ordem e progresso"...

A imprensa nativa tem lado e não nega munição em sua luta, mesmo que não seja solicitada. Estará lá, sempre a postos para o discurso da lei e da ordem. Para a desqualificação de toda e qualquer manifestação contra o poder constituído, mesmo que seja o de sua contrariedade. A mídia, sorrateiramente, assume o seu compromisso do pretenso monopólio da crítica. Um "colunista" ou "articulista" - seja lá o que for esse troço- pode ofender um presidente, debochar do Congresso e ridicularizar uma decisão judicial. Mas APENAS a imprensa pode isso. Ninguém está autorizado a se manifestar sem o seu salvo-conduto. Nem contra um governo que ela despreza e lamenta a existência. 

Fernando Haddad não é o prefeito dos sonhos da mídia paulista. Tem o fardo de ser petista, a despeito de ser de família rica, cara de bom moço, pesquisador da USP e são-paulino. Fosse por Haddad, a imprensa teria tido outra postura. Entrevistaria um manifestante pobre e lhe daria toda a emoção possível. Mas o buraco é mais embaixo. A mídia porca sabe que a encrenca é grande. Se o povão perceber que paga muito caro por ônibus lotados, desconfortáveis e nada pontuais, por que não faria o mesmo pelos trnes e metrôs? Sim, o governo do Estado de SP precisa ser preservado, mesmo que isso livre a cara do maldito governo petista na cidade de SP...

Fernando Haddad não é um político convencional do PT. É da ala "intelectual", uspiana por assim dizer. Foi pesquisador da FIPE, "fundação" da U$P que coleta dados sobre inflação na cidade de São Paulo. Foi escolhido por Lula por representar o "novo", mesmo que à custa de uma constrangida foto ao lado de Paulo Maluf. Lula viu o óbvio. Pelo lado dos mais conservadores e proto-fascistas de SP, Haddad seria mais palatável, por ser branco, de família rica, cara de bom moço, uspiano e "são-paulino"- dizem que esse conjunto de "qualidades" foi citado pelo próprio Lula, conhecedor profundo do segmento que mais odeia o PT em São Paulo. 

Pelo lado progressista, Fernando Haddad entrou na cota da esperança daqueles que sonham com o primeiro governo petista de São Paulo, o de Luíza Erundina, entre 1988 e 1992. Erundina aumentou o salário do pessoal da saúde e da educação. Saneou as contas do município mesmo aumentando gastos com a construção de escolas, hospitais, postos de saúde, creches, redes de esgotos e casas populares. A cidade de São Paulo lhe retribuiu elegendo Paulo Maluf, numa época em que não havia reeleição. Sim, o povo de São Paulo preferiu Maluf a Suplicy, apoiado por Erundina...

Em 2012, Haddad ganhou a eleição prometendo coisas que poderia fazer e muitas outras que jamais faria. Até aí, jogo jogado, pois só não sabe disso quem é ingênuo ou mau-caráter, pois TODOS os políticos do mundo fazem isso. Mas, entre as promessas de Haddad, estava a do bilhete-único mensal. Algo relativamente simples, mas que traria impacto significativo para a vida de quem depende de ônibus e tem um orçamento tão apertado que qualquer R$ 10,00 por mês faz diferença. Dado que iniciativas desse tipo são compatíveis com o que já existe em outras grandes cidades do mundo, Haddad não prometeu nada impossível de ser cumprido. 

O problema do bilhete único mensal não foi a promessa em si, mas como ela foi feita. Em primeiro lugar, a porposta depende de aprovação na Câmara dos Vereadores e ajustes num orçamento que não foi aprovado na gestão de Haddad. Dado o impacto na contas do município, o tal bilhete único mensal seria viável apenas no final segundo semestre do primeiro ano de mandato, ou no ano seguinte. 

Para a aprovação do bilhete único mensal na Câmara, Haddad teve que barganhar apoio. Sub-prefeituras e cargos em po$tos estratégicos fazem parte desse processo de construção de apoio na Câmara dos Vereadore$. Luíza Erundina comeu o pão que o PSDB amassou quando foi prefeita. O P$DB se aliou a Maluf e fez do governo Erundina um inferno. Muitas coisas não puderam ser feitas por isso. Para quem não sabe, sem apoio do legislativo, nenhum prefeito, governador ou presidente governa ou se mantém no cargo. Pergunte isso a Collor, o caído. Pergunte isso a Dilma, aliada a Sarney e Renan Calheiros em Brasília. Pergunte isso a Alckimn, apoiado pelo menino tosco do KLB na Assembleia Legislativa de SP. (O palpiteiro morre de rir dos cretinos que debocham de Tiririca, chamam Lula de burro e que votaram na legenda que deu cargo ao garoto do KLB em SP...). 


Qualquer prefeito em São Paulo teria feito o que Haddad fez para alcançar seu objetivo maior: cumprir a promessa do bilhete único que o elegeu. Mas Haddad errou a mão. As passagens de ônibus de São Paulo não foram reajustadas por anos. Gastos com mão-de-obra, manutenção e diesel exigem um reajuste anual, assim como as contas de telefone, celular e água. Seja por oportunismo, seja por qual motivo for, Gilberto Kassab, o anitgo prefeito, não fez oq ue devia: reajustar as tarifas dos ônibus. E Haddad, o homem-FIPE, sabe disso melhor do que quaquer outro palpiteiro.

Kassab deu esse presente de grego para Haddad, coisa de 'brimo". O libanês que entrou deveria ter feito o reajuste que o árabe que saiu não quis fazer. Haddad é economista, filho de dono de loja na 25 de março e ex-pesquisador da FIPE-USP. Ele sabia que o reajuste seria necessário ANTES do bilhete único. 

Se você fosse o Haddad o que faria? O mais lógico seria esclarecer a população a respeito do oportunismo de Kassab em não aumentar a passagem em ano eleitoral, 2012. E, em seguida, provar, mesmo que à custa de críticas, que esse seria o custo necessário para viabilizar o bilhete único, cuja ideia não tem nada a ver com o reajuste. Mas Kassab inventou um partido- PSD- que ensaia apoiar o PT, ao mesmo tempo em que é aliado do PSDB... Se Haddad fosse um grama mais esperto teria agido de outro modo. Amigos, amigos, negócios à parte, ensinaram seus acestrais. Uma cosia é apoio político futuro. Outra coisa é ser prejudicado por oportunismos do passado. Haddad obedeceu a Lula, a Dilma e à cúpula do PT, que sonha com uma aliança com o PSD para derrotar Alckimin em 2014. Fosse mais sábio, Haddad saberia que há certas horas que é melhor brigar com todo mundo para salvar aquilo em que acredita e que sabe que o diferenciará no futuro. Mas Haddad preferiu a omissão. Fingiu que tudo estava bem e que valeria o risco de se queimar agora para gozar dos benefícios do bilhete único mensal em 2014. 

O problema foi aparecerem tantos estudantes na Paulista. Isso não estava nos planos tecnocráticos. 


Os críticos de manifestações são os mesmos que xingam o PT e Lula, mas que não conseguiram juntar 30 pessoas na mesma avenida Paulista, à época do julgamento do "mensalão". No fundo, sentem inveja, nada mais do que isso. 


A questão das tarifas de ônibus em São Paulo passa pelas disputas eleitorais de São Paulo e de Brasília. Simplesmente isso. Quem ficar olhando vidraças quebradas de bancos e latas de lixo incendiadas cumprirá o papel de tonto que lhe tem sido habitual: o de acreditar naquilo em que vê, não naquilo que é... Grandes grupos de mídia à beira da falência e político oportunistas agradecem a sua cretinice ao chamar manifestantes de "baderneiros". 


Nota: O palpiteiro votou em Haddad e, se eleição fosse hoje, com os mesmo candidatos e circunstâncias, teria feito o mesmo. O que não significa salvao-conduto para toda e qualquer asneira que Haddad faça no cargo. Voto, voto, críticas à parte...
  


Para os invejosos do presente, uma notícia de uma passado recente...




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